quinta-feira, 2 de julho de 2015

A PRIMEIRA CEIA

Hoje postamos a última parte do texto "A Última Ceia", de Claudio Bernardi, professor da Universitá Cattolica di Milano, com tradução de Claudia Venturi. Um texto que mostra o alimento como ideia de união e fonte de guerra (como algumas filosofias, religiões etc), que explora as vaidades humanas e artísticas e o preço da ciência.



Hoje publicamos o quarto e quinto atos, mais o Exôdo.
E semana que vem teremos mais curiosidades e informações teatrais!
Acompanhem o nosso blog e boa leitura!

A Primeira Ceia
(Continuação do texto de Claudio Bernardi, com tradução de Claudia Venturi)


QUARTO PR-ATTO

SIMONAL – Meu Deus, que desastre!
EVA – Chefe, vamos arrumar tudo…
SIMONAL – Mas o que você quer arrumar?
LEO – Não, nós precisamos arrumar isso! Eu tenho que fazer a minha obra prima: a Primeira Ceia!
SIMONAL – Eu tive uma ideia idiota com o Cenáculo, me desculpem.
EVA – Mas não! A ideia é ótima. Ao contrário. Exatamente porque ficou claro que a ideia não funciona entre nós e também não funciona a representação é que não precisamos imaginá-la, mas realizá-la. Assim é o mundo. Este é o problema. E tem de haver uma solução.
LEO – O punho de ferro! Agora “eu” vou arrumar tudo isto!
SIMONAL – Mas são contratados?
LEO – Contratados?
SIMONAL – Você está pagando?
LEO – Pagando? O quê?
SIMONAL – A eles, aos estilos alimentares.
LEO – Claro que não. Ao contrário, eles deveriam me agradecer. Com a minha obra prima se tornarão famosos.
ADÃO – Ahãm! Tô sabendo!
EVA – Entendi porque eles só fazem o que querem.
MARTA – Estão errados vocês dois.
LEO – No quê? Na imagem? No quadro? Na foto?
MARTA – Não, não, vocês erraram ao tocar no problema dos problemas.
SIMONAL – E qual é?
MARTA – A alimentação. A alimentação é identitade. Cultural, religiosa, social, afettiva…
LEO – Não, a alimentação é vida. A alimentação é arte, ciência, desejo, eros! A alimentação é vida!
MARTA – Sim, mas o íntimo da vida. Pessoal e coletiva. A alimentação une, mas também divide. Coloca uns contra os outros.
ADÃO – Desde pequenos. Imagina que a minha mãe queria que eu comesse verduras e eu as cuspia todas.
EVA – A tua mãe? (lhe dá um tabefe) A tua mãe!
ADÃO – (choramingando) Mas a sopa era horrível…
LEO – Precisamos comer apenas aquilo que gostamos.
SIMONAL – Mesmo se faz mal?
LEO – Para um “natureba” tudo faz mal…
SIMONAL – Mas eu me pergunto: existe um alimento bom, saudável e nutritivo?
DOUTOR – Stop! Vocês estão procurando o alimento universal?
ADÃO – Não existe. Quando o alimento é bom, faz mal. Quando faz bem, é ruim. Quando é nutritivo não tem gosto de nada. Olha só: os veganos são amarelos como maracujás.
SIMONAL – Mas talvez eles tenham razão. Por que matamos os animais?
LEO – Por que assim também fazem os outros animais. É a cadeia alimentar. Todos os seres vivos se nutrem uns dos outros.
ADÃO – O peixe grande come o peixe pequeno
EVA – E o homem…
ADÃO – que é o animal mais irracional entre todos
LEO – come tudo de tudo. Ele está no topo da cadeia alimentar.
SIMONAL – Mas não se deixa comer por outros homens…
LEO – Hoje, mas há um tempo... Os canibais…
ADÃO – comiam a vovó ao forno com bata… (Eva lhe dá um tabefe). Mas é verdade!
SIMONAL – Mas agora não somos mais canibais…
MARTA – É não, somos ainda piores!
ADÃO – A vovó... não!
EVA – Em que sentido?
MARTA – Não  no sentido carnal, mas no espiritual…
EVA – O que é até pior.
MARTA – Sim, passamos o tempo a nos dilacerarmos uns aos outros.
SIMONAL – Como aconteceu aqui, agora há pouco…
DOUTOR – Senhoras, senhores, poderiam me escutar? Eu, eu tenho a solução real. A ciência sempre tem a solução, porque é o Caminho…
TODOS -…a verdade, a vida.
LEO – Estamos ouvindo, e qual seria a solução?
DOUTOR – A pílula.
ADÃO – Anticoncepcional (leva outro tabefe de Eva)
DOUTOR – Não. A pílula alimentar. Ei-la (pega uma cartela) Em cada uma destas pílulas tem tudo o que a energia humana necessita.
ADÃO – Ah não, se tirar o gosto, as lasanhas da vovó, o churrasco, a canjica, o aroma do café, a caipirinha…
ESFOMEADO – (do fundo) Estou com fomeeee!
DOUTOR – Mas não. A pílula alimentar é revolucionária. Não sacia somente mas, graças aos seus compostos químicos secretos desencadeia nas papilas gustativas todos os aromas, os prazeres, os sentidos e as sensações que a pessoa deseja naquele momento.
EVA – Ah! Assim, se eu tenho vontade de comer uma codorna…
ADÃO – A pílula se transforma!
DOUTOR – Sim, é mais ou menos isso, a pílula libera apenas os sabores desejados pela mente.
LEO – Estraordinário!
DOUTOR – Sim, a pílula alimentar é o verdadeiro alimento saudável, bom, nutritivo, universal. Com a pílula alimentar haverá a completa paz dos sentidos, do corpo, da família, dos povos. Dará a paz ao mundo!
EVA – Mas dessa forma o Senhor, doutor, manda às favas todos os que trabalham com a alimentação, camponeses, chefs, doceiros, mas também o Senhor  doutor que trabalha com a saúde, porque se é verdade que estamos mal, 90% das vezes é culpa daquilo que comemos e da forma como comemos…
DOUTOR – Retrogrados! Imaginem o grande progresso que o mundo pode fazer com a pílula alimentar. Não haverá mais fome no mundo. Não existirão mais disturbios alimentares. As doenças…
ADÃO – A dor de barriga e o cagalhão (tabefe de Eva)
DOUTOR – Não nos cansaremos mais e seremos todos felizes e contentes no êxtase dos sentidos.
MARTA – Certo, em casa não precisaremos mais de cozinha. Um cômodo a mais. Nada de lavar louças. Preparar a refeição, arrumar a mesa, fazer compras… para nós, mulheres, seria finalmente a libertação!
ADÃO – Mas uma pessoa se prende pelo estômago ou por outra coisa.... Mas se aquela, a beleza, é passageira, como pensam em se manter, eh?
EVA – Com esta! (tabefe em Adão)
MARTA – Mas os dentes, o estômago, o esôfago, isto é, praticamente o corpo inteiro, serviria para quê?
LEO – Lindo, maravilhoso, doutor. O Senhor encontrou aquilo que pode agradar a todos! Vamos senhores, todos ao redor da mesa. Agora sim, temos a Primeira Ceia. O Senhor doutor coloque-se ao centro e com as mãos unidas eleve a pílula alimentar, e todos os estilos alimentares a olhem adorando. (organiza de forma artistica a cena, ajustando as poses dos diversos estilos alimentar)
MARTA – Que gênio! A este doutor darão certamente o Nobel da Medicina…
EVA – Mas até mesmo o da Paz…
SIMONAL – Com licensa, doutor, mas como se chama esta pílula revolucionária?
DOUTOR – Manà!
SIMONAL – Como mana? Irmã?
DOUTOR – Não. Manà. É ingles científico.  Uma palavra composta da Man, que quer dizer Homem, e A que vem de Alimentation.  Alimentação humana.
LEO – Extraordinário!
ESFOMEADO – Estou com fome!
ADÃO – E agora não vai mais sentir fome! Doutor, posso inserir na boca uma caixa toda de Manà?
LEO – Depois, depois. Depois de minha obra prima.
SIMONAL – Estou emocionado. Esta é realmente a Primeira Ceia. O alvorecer de um mundo novo de paz, alegria, liberdade.
LEO – Não mais violência, mas amor! Doutor, erga-a bem no alto a Manà. Isso! Parados todos! Sorriam…
GEA – Ei! E eu aonde eu fico?
LEO – Oh minha cara, claro, desculpe, pode se colocar no lugar do doutor, não, coloque-se ali, no último lugar, a direita….
GEA – O quê? Eu, no último lugar?
LEO – Sim, sim, sim! Vai lá! Bio mio, meu Deus! Gea, você me dá nos nervos.
ADÃO – Os nervosos…
LEO – Santa, santissima que sa..., mas porque você sempre me enche o...
ADÃO – ovos no cesto…
LEO – O que está acontecendo, Gea? Você foi mal na prova de anatomia? A tua mãe não te deu carinho? O tuo pai te batia? O teu selênio está mais alto do que o normal? Mas por que você precisa sempre me bater os ovos?
ADÃO – em neve.
EVA – (tabefe) Glacé.
GEA – Não, querido, não estou absolutamente fora de mim. Como vovê pode ver estou calma. Calmíssima. É que eu sou a Terra. Foi você mesmo quem disse, ou não?, que eu sou a Terra?
LEO – Sim, fui eu quem falei, e agora?
GEA – E agora você é um imbecil!
LEO – Imbecil, eu? Leonardo D’Untempo, The new genius!
GEA – Sim, sim, um super imbecil. Por que se eu sou a Terra, a Mãe de todos e de tudo, me coloque no centro e não lá no fundo!
SIMONAL – Na verdade, ela tem razão…
LEO – Tudo bem, tudo bem, concordo.  Vamos fazer assim: você, fica no centro dos doze apóstolos alimentares e faz a elevação da Manà. Tudo bem? Doutor, por favor, larga a Manà para que Gea possa pegá-la e se posicione no último lugar.
DOUTOR – Eu no último lugar? Nunca e nunca. Eu sou a Ciência e nem mesmo a Terra existiria sem mim.
AVA – Mas doutor, o Senhor estará sempre no centro com a sua invenção, a Manà!
DOUTOR – Não, está ela, a amiguinha recomendada pelo diretor sabe se lá quantas vezes ele já a colocou...
LEO – Espero muitas, ela é a minha namorada!
AVA – Doutor, me desculpe, mas na ciência não conta a pessoa, conta o resultado.
EVA – E depois o Senhor não é assim tão bonito, seria uma Feia Ceia com a sua cara ao centro…
ADÃO – Se fosse um alvo…
LEO – Bio mio, bio mio, quantos problemas por nada.
EVA – Então, todos querem aparecer, estar no centro e não de lado…
GEA – Mas não é este o problema.
SIMONAL – E qual é?
GEA – Eu contesto!
LEO – De novo? Mas você foi mordida por uma formiga?
GEA – Eu contesto esta Manà, a pílula alimentar, o alimento universal. A comida igual para todos.
ADÃO – Um alimento comunista!
GEA – Não, capitalista! O alimento das multinacionais, do capitalismo global, aquele que dá lucros.
VEGANA – ao qual somos todos submetidos.
VEGETARIANA – Tira o trabalho dos camponeses.
FRUGÍVORA – É contra a biodiversidade.
ABRAÃO – O desenvolvimento sustentável.
DOUTOR – Mas o que vocês estão falando?
TODOS OS ESTILOS ALIMENTARES – (alternando-se nas falas seguintes, circundano aos poucos o Doutor que se retrai, tenta ir embora e, no final, foge seguido por todos) “Sim, doutor, você e a sua ciência, é um vendido!” “Judas! Judas!” “Por dinheiro é capaz de vender a própria mãe!” “E no entanto enganou a todos” “Ditador!” “Aproveitador” “Vocês, cientistas, são todos mentirosos vendidos!” “Salafrários!” “Abaixo a ciência”, “Liberdade!” “Não OGM”, “Abaixo a Manà!” “Peguem o Doutor!”
DOUTOR – Socooorrooooo! Piedade! Querem me matar! Não sou o seu bode expiatório! (foge seguido pelos doze enlouquecidos, inclusive Gea e depois Ava. Saem de cena)
AVA – Senhoreeesss, vooooltem…
LEO – Paareeem, tenho que fazer a minha Primeira Ceiaaaaaa….
SIMONAL – (a Eva, Marta e Adão) Ok, hoje realmente não é o dia…
EVA – Chefe, o que faremos com eles? (indica os comensais)
SIMONAL – Ah, meu Deus, já estava me esquecendo. Em breve, serviremos o segundo prato…



(programa do espetáculo na Itália)

QUINTO PR-ATTO

Apagam-se todas as luzes da sala para obter um ambiente o mais escuro possível. Entra em cena a mulher que se nutre só de luz (Lucia) com uma longa tunica branca e com uma luz acesa nas mãos. Por todo o ato Lucia acenderá lâmpadas e velas deslocadas sobre mesas e em diversos pontos do espaço e as entregará um por um a todos os estilos alimentares e aos outros atores que reaparecerão  pouco a pouco na sala.
LEO – Quem é essa?
AVA – A mulher que se nutre só de luz.
ADÃO – Não é possível! Não existe isso!
AVA – Sim, existe. Pode se informar.
EVA – E não come nada?
AVA – Isso mesmo, se nutre apenas da luz do sol.
ADÃO – Ela deve ser bem bronzeada.
EVA – E é saudável?
AVA – Como um peixe.
LEO – Mas o que ela veio fazer aqui?
AVA – Não tenho a menor ideia.
SIMONAL – Eu tenho.
LEO – Foi você que a chamou?
ADÃO – Terá sido enviada pela Bio.
 SIMONAL –Bio não, por Deus.
ADÃO E EVA – Não, Bio.
SIMONAL – Bio ou Deus não importa. Só sei que tem algo que não está certo no que eu fiz.
LEO – Mas do que você está falando Simonal? O que é que tem de errado com a nossa ideia de fazer a Primeira Ceia? (escuta-se o canto de um galo).
SIMONAL – Ouviram? Um galo. Mais uma vez eu o reneguei.
EVA – Mas quem?
SIMONAL – Eu disse e jurei que não o conhecia. Que nunca o vi, nem ouvi. Eu, o seu sucessor.
ADÃO – Mas de quem você está falando?
EVA – Dele…
ADÃO – Dele quem?
SIMONAL – Naquela noite, aquela ceia, o que exatamente aconteceu? (de varias partes os atores giram entre o público, recordando A Última Ceia. Todos com tochas nas mãos que acendem enquanto falam e apagam quando eles se calam)
MARTA – Então pegou o pão, o partiu e o deu aos seus discípulos dizendo: “Este é o meu corpo”.
ABRAÃO – Então pegou o cálice, encheu com um bom vinho, e disse: “Tomai e bebei, este é o meu sangue”.
SIMONAL – Vos dou para a salvação e a saúde de todos nós.
VEGETERIANA – Ele sabia que aquela seria a última ceia com os seus amigos.
FRUGÍVORA – Disse que queria celebrar a Pásqua com eles.
VEGANA – Mas por que não queria o cordeiro assado como era de costume?
ISMAEL – Não queria carne. Escolheu os vegetais. A farinha do pão. A uva do vinho.
ESFOMEADO – O fruto do trabalho do homem.
DOUTOR – Ele queria mudar. Sabia que no início o alimento vinha do sacrifício de tantos animais.
ONÍVORO – E talvez soubesse que o primeiro banquete, a primeira ceia, era de carne de homens sacrificados.
CARNÍVORO – Dos quais os corpos assados vinham compartilhados.
CRUDÍVORO – É o canibalismo antigo narrado pelos mitos.
CELÍACA – O sacrifício humano.
GULOSA – Superado pelo povo eleito, quando Abraão retirou a mão e a faca do seu filho Isac.
GEA – E um anjo o indicou um carneiro em substituição.
MARTA – Mas até mesmo essa substituição ele quer superar.
VEGANA – Ele queria substituir a carne de qualquer animal.
CARNÍVORO – Mas sem violar a libertdade de cada um.
ONÍVORO – O princípio de que podemos comer tudo.
VEGETARIANA – Sim, mas mesmo que tudo seja lícito, nem tudo é bom
FRUGÍVORA – ou saudável.
SIMONAL – Mas ele, não buscava o alimento bom, saudável e nutritivo.
MARTA – Queria nos deixar algo de mais profundo.
GEA – Não só de pão vive o homem.
LEO – Há uma relação muito tênue entre o alimento e as pessoas.
EVA – Entre alimento e paz.
ADÃO – Entre alimento e opressão.
CRUDÍVORO – Entre alimento e vida.
CARNÍVORO – Pessoal e social.
ESFOMEADO – O que ele queria é que nenhum alimento fosse fruto de assaltos, violência, guerras, destruição. É um enorme sacrifício humano privar os povos devido a fome cruel de dinheiro e poder. E loucamente passar da distruição dos outros até a autodestruição.
GEA – Até a morte da terra, do mar, do céu.
ISMAEL – O problema ontem, hoje e amanhã é sempre o mesmo: como salvar o homem de si mesmo?
SIMONAL – Ele buscava um alimento que nutrisse, mas não matasse.
ABRAÃO – Um alimento que não corrompesse e não se corrompesse.
ADÃO – Que não nos fizesse mal.
SIMONAL – Então, um alimento eterno, espiritual.
EVA – Que pudesse unir os homens, as suas culturas, os seus estilos alimentares, como agora nós…
CRUDÍVORO – Sonhava?
ONÍVORO – Não, nunca será possível que todos os homens…
GULOSA – Mas até isso ele sabia.
MARTA – E não foi por acaso que naquela ceia estivesse presente exatamente quem o traiu por dinheiro.
SIMONAL – E eu em todas as Últimas ceias sou representado com uma faca nas mãos. Para lembrar que naquele local, quando vieram para capturá-lo, eu pensava, como todos, que só com a força e com a espada se pode defender e haver justiça. E estarmos juntos…
EVA – Mas não vamos nos esquecer dos seus outros amigos, os apóstolos.
ADÃO – Escaparam todos, os infames.
AVA – E o que nós faremos agora? Fugimos de tudo, por medo. Não queremos ver nada, pensar nada, fazer nada…
ADÃO – SOS! SOS! Salve-se quem puder!
CELÍACA – Não, não. Salvem as nossas almas.
GEA – Existe uma particularidade a ser observada naquela última ceia. Não tinham mulheres.
AVA – E até isto ele sabia.
ADÃO – O que ele sabia?
EVA – Que a cruel espécie humana é cruel porque se dividiu entre masculino e feminino. Ele o  patrão, ela a serva.
MARTA – Contra a criação. Deus não criou o homem, mas os criou macho e fêmea.
GULOSA – Para o encontro, a relação.
VEGETARIANA – Na cruz por causa disso concedeu ao jovem homem, João, à mãe.
FRUGÍVORA – E as mulheres foram as primeiras testemunhas da sua resurreição.
VEGANA – Queria o fim da faca, do sangue versado, da violência, do nosso choro, de cada execução.
CRUDÍVORO – O alimento mortal do mundo daquele tempo.
ONÍVORO – E de hoje, ainda.
CELÍACA – Fez também mais uma coisa para mudar o poder e salvar a carne.
SIMONAL – Ele, Deus, o rei lavou os pés dos seus como se fosse um servo. E disse: “Lavem os pés uns dos outros.” Isto é sirvam-se uns aos outros. E quem tem mais poder, sirva mais do que todos os outros.
DOUTOR – Os cientistas, os professores, para a saúde de muitos e não para o benefício de poucos que os pagam deveriam ser os primeiros a criar, inventar, estudar, ensinar…
ABRAÃO – Mas o terceiro pilar daquela noite foi o mandamento, a nova lei que diz: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. E deu tudo ele mesmo.
ESFOMEADO – Luz da luz…
MARTA – Pão do céu… como o sol…
EVA – Nos nutre o amor.
SIMONAL – Mas se foi assim, aquela não foi então a Última Ceia. Não. Foi a primeira. A primeira verdadeira Ceia.
ADÃO – A Ceia de Primavera!
(todos os estilos alimentares, pouco a puoco, aproximam-se da mesa do cenáculo e compoem o Cenáculo de pentecostes com Gea ao centro, mas tendo sobre a cabeça as mãos de Lucia que erguem a luz e todos os estilos alimentares têm uma vela consigo)
LEO – Perfeito! Perfeito! Todos parados! Esta, esta sim é a Primeira Ceia! (flash, música apropriada, e então se acendem as luzes)
ADÃO – Dulcis in fundo! (todos começam a servir os comensais)
Vem servidos os doces



(programa do espetáculo na Itália)

EXÔDO

SIMONAL – Caros amios, obrigado por terem vindo.
ADÃO – Por terem resistido.
SIMONAL – O meu experimento fracassou. Não farei nenhum restaurante nem cenáculo.
MARTA – Esperamos apenas que aquilo que demos aqui os tenha agradado.
SIMONAL – Se não os agradou, pedimos que nos perdoem. Eu sonhava com um pequeno evento ou, pelo menos, um forte momento no qual o nosso pequeno mundo se escancarasse. Sonhava com um fogo que tivesse nos aquecido. Uma luz que nos teria iluminado. Algo de belo para nos recordarmos.
MARTA – O espetáculo-ceia acabou.
EVA – Nos despedimos com o desejo de que, de alguma forma, esta pequena semente que plantamos no coração e na mente, cresça e dê frutos maiores do que imaginamos.
SIMONAL – Isso e não apenas. Daquela primeira ceia aconteceram tantas outras ceias, com desilusões, mortos, traições. Não estamos ainda em um mundo perfeito, mas muita coisa já mudou no homem.
MARTA – Ainda temos muito o que fazer, para que se aproximem todos do refeitório daquele magnífico mundo que é a criação, repleto de frutas e de tantas delícias
EVA – De irmãos e amigos
SIMONAL – Juntos e felizes para o sol do pão
ADÃO - e a jóia do vinho!
MARTA – Realizar todos os dias a verdadeira ceia agora é tarefa de vocês!
EVA – Mas também nossa, depois de hoje. Obrigada amigos.
SIMONAL – Tin Tin ao alimento verdadeiro, que quanto mais nos nutre mais o queremos.
MARTA – O alimento infinito da luz, o único alimento que dá vida e não morre.
EVA – O amor.


Fim


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