“Não
há coisa mais deliciosa do que a vida de artista, mas custa muito caro. Precisa
de muito instinto e felicidade guerreira.”
Entrevista: Zé Celso Martinez Corrêa
Nesta
semana o Círculo Artístico Teodora posta uma entrevista com um dos mais
importantes nomes do Teatro Brasileiro. Seja pela inovação e irreverência de
seus trabalhos, seja pelo posicionamento político e social. Um gênio para uns,
o “velho que gosta de mostrar a bunda” para outros, mas sempre polêmico e
marcante.
Boa
leitura!
Foto do site http://revistatrip.uol.com.br/trip/ze-celso |
Entrevista com José Celso Martinez
Por *Elisa Duarte/Revista Contigo!
“Ator
é o que age, atua em si mesmo, no outro, na matéria do mundo.”
O
diretor começou a ser visto como referência teatral após o espetáculo O Rei da
Vela (1967), de Oswald de Andrade, considerada uma das montagens mais
inovadoras do diretor pelos acessórios, cenário e músicas.
Quais as bases para uma pessoa permanecer na carreira de teatro e
perseverar na profissão de ator? Há um caminho a seguir?
Não
há caminho certo. Ao contrário, é preciso inventar caminhos, impulsionado pelos
teus desejos mais secretos, mais proibidos, considerados ''errados'', tabus
pela maioria do rebanho. Mas o teatro você faz com outros, não é uma arte
solitária. Você precisa comungar, comer e ser comido por pessoas que, por
coincidência milagrosa no tempo, você encontra, que queiram partir contigo, na
busca de dar pelo teatro mais vida às suas vidas e à vida de todo mundo: o
público do seu tempo. É como encontrar muitos amantes, encontrar os parceiros
de jogo desta orgia que é o teatro. Para permanecer nesta "roça", é
preciso ser antes de tudo "um forte", pois você vai ter que dia a
dia, noite a noite, conquistar tua permanência sambando na corda bamba da
fatalidade, que são as transformações permanentes da vida e da morte. Estar
plugado sempre em todo mundo, mas ir mais além no risco, na beleza, com ginga
na arte de teatro, que é a mesma que a de amar e a de viver.
Qual o princípio básico de um ator? O que ele deve desejar em primeiro
lugar?
Ator
é o que age, atua em si mesmo, no outro, na matéria do mundo. O ator não
''deve'' nada, ele tem é de assumir seu poder humano, o poder do seu corpo, que
é quem sabe o que ele, corpo, quer desejar. Atuar é desejar outros corpos do
mundo, além das máscaras profissionais, da idade, de classe, dos armários,
enfim, além do bem e do mal. Teu próprio desejo vai descobrir - no espelho do
desejo dos outros você vai escolher como companhia através da poesia do teatro
de hoje e do mais antigo.
Como prepara seus atores?
Preparando-me
para merecer encontrar atores. Atuando sobre a coragem do meu instinto para
entrar em sintonia com os que mexem comigo, isto é, que atuam comigo. É como o
namoro. É difícil explicar por que você ama umas pessoas e não outras. Os
atores e atrizes revelam-se como enamorados. A arte do teatro não é diferente
da arte da paixão, de produzir e adorar a beleza, da arte de viver intensamente,
enfim. Não há coisa mais deliciosa do que a vida de artista, mas custa muito
caro. Precisa de muito instinto e felicidade guerreira.
O que pensa grande número de pessoas que buscam a carreira de ator
apenas para ficarem famosas?
A
arte do ator é a da interpretação da vida a partir do seu corpo, em contato com
tudo e todos pelos seus sentidos. O ator que se vende para tornar-se
celebridade, ter fama, ficar rico, ter prestígio social, sacrifica muitas vezes
sua arte, que é a de interpretar-se e passa a ser interpretado pelos
marqueteiros do ibope. Claro que o ator quer e merece ser reconhecido, é
justíssimo, mas os que têm o que dizer ao mundo são mais ambiciosos, querem
mais que ser celebridade, querem ser eternos, imortais na sua total
mortalidade. Estes deixam vestígio de sua passagem no mundo, tatuam o coração
da condição humana.
Foto do site: Entretenimento UOL |
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